A Pele e a Histoplasmose – uma atração fatal
Histoplasmose é sem sombra de dúvidas uma das micoses sistêmicas mais importantes para nós, médicos.
Quando pensamos nesta doença logo nos vem a cabeça quadros pulmonares e quadros disseminados em pacientes portadores do vírus HIV.
Não que esteja errado pensar desta forma. É inclusive uma ótima forma de lembrarmos da doença, desde que tenhamos a clareza que, ao adotarmos nesta linha de pensamento nós contribuímos com um dos principais desafios que a histoplasmose impõe para nós médicos: O DIAGNÓSTICO
Na boca de completar 125 anos, desde a sua primeira descrição, feita por Darling, médico americano que durante a necrópsia de um paciente de origem africana, lá no Panamá, morre de uma doença que ele intitulou como Doença Generalizada com pseudotubercúlos pulmonares e nocrose focal no baço, fígado e linfonodos causado por um protozoário
E de forma não intencional este primeiro caso refle muito do que acontece mesmo nos dias de hoje.
Muitos dos casos de histoplasmose não são diagnosticados em vida
Esta frase em destaque é o que diz uma dissertação de mestrado realizada na Fundação de Medicina Tropical, aqui do Amazonas, em que a autora descreve a causa de morte em pacientes portadores de HIV.
Outro aspecto muito interessante da primeira descrição, da então doença de Darling, é que o autor interpretou o fungo como sendo um protozoário. Isso se deveu à presença do agente no interior de células fagocíticas, como visto na leishmaniose.
Na histologia ou exame direto os fungos intracelulares confundem os olhos não treinados que podem interpretar o Histoplasma capsulatum como uma Leishmaniia sp.
Essa confusão logo foi desfeita pelo Brasileiro Henrique da Rocha Lima, isso já no ano seguinte.
E para quem tiver um pouco mais de interesse em saber como foi a História da Histoplasmose não deixe de ler.
Voltando para a pele, temos aqui uma atração fatal que vai demandar do clínico uma linha de raciocínio elaborada, porém formativa em direção ao diagnóstico correto da micose.
Temos alguns pré-requisitos que vão direcionar e facilitar a nossa forma de pensar e nos proteger de possíveis armadílhas enquanto nos leva ao diagnóstico correto
O primeiro é saber que existem, além das subespécies (Conheça os Subtipos de Histoplasmose) temos também diferentes clades, que na época do texto eram 07 (Clades e histoplasmose, a importância para o clínico). Ao reconhecermos as variações e diferenças teremos clareza que os casos de histoplasmose vão variar conforme a geografia e o olhar do colega médico.
É esperado que tenhamos diferenças regionas nas manifestações clínicas da histoplasmose
Outro aspecto fundamental é o reconhecermos as principais síndromes clínicas associadas com a histoplasmose, tema que discuto no artigo Histoplasmose e as suas síndromes clínicas.
Por fim precisamos entender a relação da pele com o fungo, e já posso te adiantar que o amor é grande.
Nos casos pulmonares agudos, a pele é atingida de forma indireta com lesões inflamatórias reacionais, estamos falando aqui do eritema nodoso e do eritema multiforme. Artrite é um sintoma associado a esses quadros.
Logo, em pacientes com quadro respiratório agudo com surgimento de lesões de pele inflamatórias, podemos suspeitar de histoplasmose. Nesse contexto a pele não alberga o fungo e não é fonte de diagnóstico microbilógico.
No contexto da doença disseminada a história é outra. Estamos falando de doença que mira o sistema imune, classicamente estamos falando dos órgãos imunológicos primário (medula óssea) e secundários (baço e linfonodo).
Os mais letrados na imunologia devem estar na dúvida, mas e a pele, o fígado e o trato gastrointestinal? E a resposta são acometidos em frequências variadas.
Aqui na região amazônica, quadros dermatológicos da histoplasmose acometem mais de 50% dos casos e dessa forma a pele é considerada como importante fonte de diagnóstico.
Na prática estamos falando de casos em que a sispeita da histoplasmose nasce pela pele. Estamos falando da suspeita clínica vinda da histopatologia, pela presença de granulomas e presença do fungo. E estamos falando da micologia, que ao receber o fragmento da pele, consegue isolar e cultivar o fungo.
O desafio é sabermos quando devemos suspeitar de histoplasmose, na ectoscopia.
O contexto clínico é fundamental e já vamos relembrar os mais importantes.
E pela pele, te informo que nestes últimos 20 anos de medicina tropical, a pele é muito mais do que as clássicas lesões molusco contagioso símile.
Estamos falando de uma miríade de apresentações que sistematizei para você.
Segue uma lista das síndromes dertológicas que encontramos na histoplasmose disseminada:
- Padrão molusco contagioso
- Úlcera periorificial
- Padrão aceneiforme com a variante rosaiceforme
- Úlcera necrótica
- Pápulas e placas inflamatórias
- Sarcoma de Kaposi símile
- Ectima símile
- Prurigo símile
- Vasculite cutânea
- Foliculite
- Miscelânia
Caramba, se você ficou confuso ou estressado, não tivemos esse objetivo. A ideia é organizar. Vamos precisar também do contexto clínico do paciente que apresenta as lesões que citamos.
Vamos então relembrar os contextos que devemos lembrar da histoplasmose pelo exame da pele:
- Doença que leva a imunossupressão do braço celular
- Imunossupressão medicamentosa que levam a disfunção macrofágica (inibidor de TNF e Corticoesteróides)
- Quadros febris com aumento de linfonodo, baço e fígado
- Quadros febris com bi-citopenia ou pan-citopenia
- Portador do HIV com CD4<100
Em resumo, para lembrarmos da histoplasmose precisamos, pegar a frase emprestada da sífilis e pensar histoplasmosicamente
Sei que é uma doença difícil, que realmente demanda de nós clínicos um alto nível de suspeição clínica e de uma verdadeira estratégia para chegarmos ao diagnóstico final.
Fica a mensagem que a pele é o seu aliado diagnóstico, basta saber interpretar o que a pele lhe diz.
E caso você queira mais histoplasmose, queira aprender histoplasmose usando a pele como palco.
Fica o convite para você assistir uma aula que preparei para você relembrar um pouco mais da micose.
E para não perdermos o hábito, lembro de você compartilhar com o colega a sua experiência em histoplasmose.